O Paizinho
Ainda hoje exibo orgulhosa a pequena fotografia a preto e branco.
Ele já tinha cabelo, quase todo, branco, e eu ainda na escola primária andava.
Gostava de o ter conhecido com o cabelo às ondinhas. Um galã. Um autêntico artista de cinema.
Nunca mais esqueci o dia da foto. De mão dada, seguia altiva. Tínhamos ido à missa à Capela da Nª Sª da Ajuda. Depois fomos ver o mar, e foi aqui que apareceu o inesperado fotógrafo.
Pena ser a preto e branco. Levava metade do meu cabelo apanhado no alto da cabeça, onde era notório o grande laçarote branco. O vestido era rosa bebé, com umas aplicações, desde os ombros até à zona do umbigo, onde passava uma fita de seda igualmente rosa. Levava ainda um casaco de malha quente e de cor azul clara, feito pela mãezinha. Os sapatos eram pretos e de verniz, enfiados numas límpidas meias brancas.
Gostava de ver as fotografias a preto e branco que eram guardadas no álbum. Apresentava sempre um ar charmoso – os ossos ainda não se queixavam. Tinha realmente ar de galã, talvez tivesse sido assim que teve frutos na conquista do seu amor.
Um dia contei-lhe que em tempos tinha imitado a sua assinatura, para ele não ver as más notas da escola. Sorriu. O meu desabafo foi uma maneira de me redimir. Também lhe contei daquela vez, em que estando em casa sozinha com o Dito, distraímo-nos e começamos a jogar à bola. Azar, acertei em cheio no relógio de parede, que caiu – já não há relógios assim, pois não sofreu muitos danos. Até àquela data sempre pensou que o relógio tinha caído por desleixo do prego.
Quando me cabia a mim, a vez de limpar o pó no quarto deles, abria a porta do guarda-fatos e perdia-me entre o cheiro da roupa domingueira, sempre perfumada.
Foi muito bom tê-lo como pai – jamais o trocaria.
Foi bom vê-lo como avô.
(para os netos do meu pai)
com carinho
a.
